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Comitê: Psicologia

Conhecimento, atitude e intenções em relação à criopreservação da fertilidade.

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Conhecimento, atitude e intenções em relação à criopreservação da fertilidade.

Por Rose Marie Massaro Melamed
Psicóloga CRP 06/11807
Membro do Comitê de Saúde Mental da SBRH


A medicina reprodutiva é atravessada por muitas questões que ultrapassam o âmbito biotecnológico e remetem a diferentes vieses, demandando cuidado e atenção.

Com o objetivo de provocar um processo reflexivo, na tentativa de favorecer a comunicação entre o paciente e a equipe de reprodução assistida, destacaremos o tema da criopreservação de células germinativas femininas e as possíveis repercussões deste procedimento.

Verificamos que a preservação da fertilidade, recurso oferecido a partir do desenvolvimento da biotecnologia, tem hoje disponibilizado o congelamento de células germinativas, o que propicia a gestação em tempo mais adequado (1). É uma técnica que favorece pacientes com diagnóstico de câncer, sendo importante ressaltarmos que tem sido observado um aumento da incidência de pessoas jovens com neoplasias.

Assim, a criopreservação Oncológica beneficiou pacientes que sobrevivem após o tratamento de câncer, visto que a cura e a qualidade de vida destas pessoas vêm aumentando, e o material preservado torna viável a possibilidade de formarem seus núcleos familiares com filhos biológicos (2). A possibilidade da perda da fertilidade, costuma gerar uma grande preocupação entre pacientes com câncer e, independente do sexo/gênero, os pacientes preferem filhos biológicos a adotar ou usar material de terceiros.

As instruções relacionadas a preservação da fertilidade são divulgadas pela ASCO- American Society of Clinical Oncology, uma organização profissional que representa médicos de todas as subespecialidades de oncologia que cuidam de pessoas com câncer, e em 2018, recomendou as diretrizes relacionadas a preservação da fertilidade dizendo que: “todos os pacientes com câncer devem receber orientação sobre o efeito dos tratamentos de câncer sobre a fertilidade e as opções para preservá-la”.

E esta é uma questão, portanto, que não deve ser esquecida pelos oncologistas e suas equipes, ou seja, a da preservação da fertilidade em pacientes jovens / em idade reprodutiva, submetidos a terapia antineoplásica (2)

Mas, será que as recomendações são cumpridas?

Se atentarmos aos resultados da pesquisa realizada com profissionais de saúde do norte da Índia, para verificar o conhecimento e as atitudes deles em relação à preservação da fertilidade, observaremos uma resposta pouco favorável para resguardar a possibilidade de o paciente vir a ter seus descendentes a partir de sua carga genética.
Trata-se de uma pesquisa de oncofertilidade, realizada por meio de questionário estruturado. Os questionários foram enviados por meios eletrônicos para profissionais envolvidos no atendimento de pacientes com câncer e suas respostas foram analisadas posteriormente. Foram contatados 750 profissionais entre ginecologistas, cirurgiões e oncologistas, 37,7% dos formulários foram devolvidos. Esta conta por si só poderia ser lida, como a pouca importância dada ao assunto.

Os resultados, obtidos a partir dos questionários respondidos e devolvidos aos pesquisadores, demonstram o prejuízo ocasionado pela falta de informação e preparo dos profissionais para lidar com a preservação da fertilidade. Muito embora a maioria dos profissionais, 90% estivessem cientes dos efeitos nocivos da terapia para combater o câncer, 76% relataram ter conhecimento parcial da preservação da fertilidade. Sobre os envolvidos no atendimento de jovens em tratamento de câncer, segundo os autores, 50% relataram que encaminham estes pacientes para a criopreservar a fertilidade.

Nessa perspectiva, indagamos se os dados relatados pelos autores, não seriam similares aos de tantos outros países, nos quais há a necessidade de estabelecer redes bem estruturadas para melhorar o conhecimento sobre a preservação da fertilidade entre os profissionais de saúde para que pacientes com câncer tenham a oportunidade de ter sua própria descendência genética após a cura do mesmo.

O resultado mais favorável, diz respeito a intenção dos entrevistados no desejo de aprimorarem seus conhecimentos na área da oncofertilidade por meio de programas e seminários de educação continuada. (3)
A importância dos programas de educação continuada, visando atualizar profissionais e equipes sobre o desenvolvimento de novos recursos e técnicas de áreas especificas, é indiscutível, porém, ressaltar a relevância do aprimoramento da equipe de reprodução assistida para melhorar os processos de comunicação com o paciente é mister.

A exemplo da relevância acima citada, ressaltaremos o desconforto enfrentado pelo paciente diante da comunicação de uma notícia crítica passada de forma pouco empática. Ilustraremos este fato utilizando uma matéria publicada no Jornal A Folha de São Paulo, intitulada “Percalços da Gravidez Tardia”. (4)
Nesta matéria, “a escritora relembra sua decisão de congelar os óvulos aos 37 anos, descreve os tratamentos caros e sem garantia de sucesso de reprodução assistida e reflete sobre a decisão de protelar a gravidez pode ser resultado de uma ideia equivocada…”.

Relembremos que a criopreservação de gametas, embriões e tecido reprodutivo tem permitido que cada vez mais pessoas, incluindo pacientes que não necessitem de tratamento médico, possam contar com os progressos como alternativa para minimizar conflitos decorrentes do adiamento da gestação por múltiplos fatores, inclusive sociais.

Temos observado que a demanda de mulheres solteiras, que optam pelo congelamento de seus óvulos como um “seguro” para terem um filho no futuro tem aumentado; porém o procedimento de criopreservação proporciona tentativas de fertilizações in vitro e não a garantia de uma gravidez. Assim sendo, pacientes necessitam serem orientadas frente aos aspectos psicológicos e sociais oferecidos pela técnica de reprodução assistida ao ser utilizado o recurso da criopreservação, outrossim, devem ser investigadas as expectativas de sucesso, visto que nem sempre é realista sobre o congelamento de oócitos e a possibilidade de uma concepção numa fase futura. (1)
Ao contemplar as expectativas de uma pessoa ou casal ao entrar em um Centro de Reprodução Assistida, observamos que, independentemente do que os levou até a consulta com o especialista, todos chegam inflados de expectativas, no sentido de terem uma chance de 100% de edificar o núcleo familiar com herdeiros biológicos, sem mesmo que este processo tenha que aguardar algum tempo para ser realizado, como é o caso das pessoas que buscam o congelamento de células germinativas.

Para Madalosso, autora da matéria acima referida, a reprodução assistida é uma mãe para a humanidade, visto que, continua a autora: “Segundo o Comitê Internacional para Monitoramento de Técnicas de Reprodução Assistida, de 1978, quando nasceu o primeiro bebê de fertilização in vitro, até 2018, a técnica já gerou 8 milhões de bebês, para a sorte de famílias que nunca conseguiriam ter filhos de outra maneira. E, não há números relativos aos tratamentos que não deram certo, mas não é preciso ir muito longe para saber que também são muitos”.

Chegamos a um ponto de extrema vulnerabilidade para todos os envolvidos no processo de reprodução assistida, a começar pelo profissional e sua equipe, que se encontram diante do desafio de comunicar diagnósticos, resultados e desfechos críticos, ao paciente/casal que em alguns casos necessitará de um espaço psicoterapêutico para a elaboração do luto desencadeado pelo “imprevisto” do prognóstico apresentado e dos conflitos e questionamentos a elas atrelados.

A conduta médica tem uma influência sobre a vida de uma pessoa em sofrimento. É obrigação do profissional o respeito à pessoa e evitar todas as coisas que tenham a tendência de desencorajar o paciente e deprimir seu espírito (5).

A comunicação de más notícias é aquela que causa sensações desagradáveis em um de seus agentes, principalmente, aquelas associadas a diagnosticar e prognosticar enfermidades, sendo essa uma constante no cotidiano dos profissionais de saúde (6).

Os processos de enfrentamento às más notícias são singulares, o sistema de atenção e comunicação precisam ser reforçados. É importante a escuta dos profissionais e pacientes para que cada um expresse suas dúvidas e ansiedades de forma proveitosa; e, assim, toda a equipe deve estar capacitada para melhorar os processos de comunicação, com foco no aperfeiçoamento da experiencia dos pacientes, por meio de um atendimento empático, respeitoso e humanizado.

Referências bibliográficas

Melamed, R. M. M. Da infertilidade e suas versões in Quayle, J. O Adoecer,155-176 Editora dos Editores – São Paulo; 2019
Melamed, R. M. M.; Avelar, C. C. Criopreservação oncológica e social. Temas contemporâneos de psicologia em Reprodução humana assistida- A infertilidade em seu espectro Psicossocial – Livrus São Paulo; 2015
Malhota, N.; Gupta, M.; Yaclav, A.; Mahey, R. Knowledge, attitude, and intentions towards Fertility preservation in cancer patients among healthcare works in Northern India. In JBRA, Assist. Reproduzir, 2022; 26(2) 305-309
Madalosso, G. – Percalços da gravidez tardia In Folha de São Paulo, Caderno Ilustrada; pag. C 6 e C7 – 08 de maio de 2022.
Melamed, R. M. M.; Travain, A. S. A.; Suporte emocional às más notícias, in Reprodução Assistida In: Straube, K. M.; Melamed, R. M. M. Guia de Recomendações de Atenção Psicossocial nos Centros de Reprodução Assistida – S B R A – Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida Editora Soul, São Paulo; 2018.
Borges, M. D. S., Freitas, G., & Gurgel, W. (2012). A comunicação da má notícia na visão dos profissionais de saúde. Tempus Actas de Saúde Coletiva, 6(3), 113-126. doi: http://dx.doi. org/10.18569/tempus. v6i3.1159