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Comitê: Infertilidade

Criopreservação Eletiva de Oócitos por Declínio da Fertilidade Relacionado à Idade

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Cesar Cornel¹, Giuliano Bedoschi¹

¹Comitê de Infertilidade da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana

 

Introdução e Justificativa

A criopreservação eletiva de oócitos é uma técnica inovadora que permite a preservação da fertilidade em mulheres que optam por adiar a maternidade devido a razões pessoais, profissionais ou médicas1,2. A técnica envolve a coleta e congelamento de oócitos para uso futuro, proporcionando uma alternativa viável para mulheres que desejam preservar sua capacidade reprodutiva diante da diminuição natural da fertilidade com o avanço da idade. Este procedimento tem se tornado cada vez mais relevante no contexto das mudanças sociais e econômicas que levam as mulheres a postergar a constituição de suas famílias3,4. Em relação à terminologia para este tipo de procedimento, termos como congelamento de óvulos social, não médico e eletivo têm sido fortemente criticados. Stoop e colaboradores, sugerem o termo “congelamento de óvulos para exaustão antecipada de gametas”5 e o Grupo de Trabalho da ESHRE (2012) utiliza “perda de fertilidade relacionada à idade”6. Neste documento, utilizamos “criopreservação de oócitos por declínio da fertilidade relacionado à idade”, reconhecendo que todos os termos carregam suposições normativas implícitas e que não existe terminologia neutra. Além disso, a criopreservação de oócitos pode ser particularmente benéfica para mulheres que enfrentam condições médicas que podem comprometer sua fertilidade, como tratamentos gonadotóxicos ou doenças ovarianas.

 

Critérios para a Criopreservação de Oócitos

Os critérios para a criopreservação eletiva de oócitos devem ser bem estabelecidos para garantir a eficácia e a segurança do procedimento. As principais indicações incluem:

 

– Idade da Mulher: A idade é um fator crucial na criopreservação de oócitos. Idealmente, o procedimento deve ser realizado em mulheres jovens, preferencialmente abaixo dos 35 anos, quando a qualidade e a quantidade dos oócitos são superiores. Mulheres entre 35 e 40 anos também podem se beneficiar do procedimento, embora a eficácia possa ser reduzida.

– Saúde Geral: Mulheres que desejam realizar a criopreservação de oócitos devem estar em boas condições de saúde, sem doenças que possam comprometer a qualidade dos oócitos ou aumentar os riscos associados à estimulação ovariana.

– Histórico Reprodutivo: Mulheres sem histórico de problemas reprodutivos significativos são candidatas ideais para a criopreservação de oócitos. Aqueles com histórico de endometriose severa, falência ovariana prematura ou outras condições reprodutivas devem ser avaliadas individualmente.

– Informação e Consentimento: As candidatas devem ser completamente informadas sobre o procedimento, suas implicações, riscos e taxas de sucesso. O consentimento informado é essencial para garantir que a decisão de proceder com a criopreservação seja tomada com pleno conhecimento de todas as variáveis envolvidas.

 

Aspectos Éticos e Legais

A criopreservação eletiva de oócitos levanta uma série de questões éticas e legais que devem ser cuidadosamente consideradas. A autonomia reprodutiva é um princípio central, garantindo que as mulheres tenham o direito de decidir sobre a preservação de sua fertilidade. No entanto, é fundamental abordar as seguintes considerações:

– Transparência nas Informações: As mulheres devem receber informações claras e precisas sobre as taxas de sucesso do procedimento, riscos envolvidos e possíveis complicações a longo prazo. Isso inclui a divulgação das taxas de sobrevivência dos oócitos após descongelamento, taxas de fertilização in vitro (FIV) e taxas de nascimentos vivos.

– Consentimento Informado: O processo de consentimento informado deve ser robusto, garantindo que as mulheres compreendam plenamente as implicações do procedimento. Isso inclui discussões sobre os riscos médicos, custos financeiros e as possibilidades de não utilização dos oócitos criopreservados.

 

Informações e Consentimento

O consentimento informado é um componente crítico na criopreservação eletiva de oócitos. O processo deve garantir que as mulheres estejam totalmente cientes dos seguintes aspectos:

 

– Eficácia e Taxas de Sucesso: Informar sobre as taxas de sucesso do procedimento com base em dados clínicos e registros de FIV. Isso inclui a sobrevivência dos oócitos após descongelamento, taxas de fertilização e taxas de nascimentos vivos.

– Riscos e Complicações: Discutir os potenciais riscos associados ao procedimento, como a síndrome de hiperestimulação ovariana, complicações durante a coleta de oócitos e possíveis efeitos a longo prazo para a mãe e o filho.

– Custos: Detalhar os custos financeiros do procedimento, incluindo a estimulação ovariana, coleta, vitrificação, armazenamento e o eventual uso futuro dos oócitos.

– Possibilidades de Não Utilização: Explicar que nem todos os oócitos criopreservados podem ser utilizados no futuro, devido a fatores como mudanças nas circunstâncias pessoais, avanços na tecnologia ou a decisão de não utilizar os oócitos.

 

Aspectos Técnicos e Clínicos

A criopreservação de oócitos envolve várias etapas técnicas e clínicas que devem ser realizadas com precisão para garantir a qualidade dos oócitos coletados:

 

– Estimulação Ovariana: A mulher recebe medicamentos hormonais para estimular o crescimento de múltiplos folículos nos ovários. A resposta à estimulação é monitorada por meio de ultrassonografias e exames de sangue.

– Coleta de Oócitos: Os oócitos são coletados por meio de um procedimento de aspiração transvaginal dos folículos, realizado sob sedação ou anestesia leve. Os oócitos coletados são avaliados quanto à sua maturidade e qualidade.

– Vitrificação: Os oócitos maduros são submetidos ao processo de vitrificação, uma técnica de congelamento ultrarrápido que previne a formação de cristais de gelo que podem danificar as células. A vitrificação aumenta significativamente as taxas de sobrevivência dos oócitos após o descongelamento.

– Armazenamento: Os oócitos vitrificados são armazenados em tanques de nitrogênio líquido a temperaturas extremamente baixas até que sejam necessários para uso futuro.

 

Taxas de Sucesso e Eficácia

A eficácia da criopreservação de oócitos depende de vários fatores, incluindo a idade da mulher no momento da coleta e a qualidade dos oócitos:

 

– Idade e Qualidade dos Oócitos: A eficácia da criopreservação de oócitos depende de vários fatores, incluindo a idade da mulher no momento da coleta e a qualidade dos oócitos. Mulheres que congelam seus oócitos antes dos 35 anos têm taxas de sucesso significativamente mais altas devido à melhor qualidade e quantidade de oócitos. O estudo de Cobo e colaboradores7 demonstrou que a criopreservação de oócitos tem uma taxa cumulativa de nascidos vivos (TCNV) muito alta para aquelas que congelaram antes dos 35 anos, aproximando-se de 95% em casos com 24 ou mais oócitos descongelados e utilizados, enquanto uma TCNV de 42,8% foi observada a partir de 10 oócitos. Em contraste, para aquelas que congelaram após os 35 anos, a máxima TCNV alcançada foi de 50% após o uso de 20 ou mais oócitos descongelados, com uma TCNV de 25,2% para 10 oócitos congelados. Esses dados enfatizam a importância da idade na criopreservação, sendo um fator determinante para o sucesso do procedimento.

Além disso, estudos mostram que os oócitos vitrificados têm altas taxas de sobrevivência após o descongelamento, comparáveis às taxas de fertilização de oócitos frescos. As taxas de nascimentos vivos também são encorajadoras, embora variem de acordo com a clínica e a experiência do profissional. Dados clínicos de registros de FIV indicam que a criopreservação de oócitos pode resultar em taxas de gravidez e nascimentos vivos comparáveis às obtidas com oócitos frescos, especialmente em mulheres jovens. Assim, a idade na criopreservação é um fator chave, e as pacientes devem ser informadas sobre a importância de congelar os oócitos em uma idade mais jovem para maximizar as chances de sucesso.

 

– Probabilidade de Uso dos Oócitos: Os dados sobre a probabilidade de utilização dos oócitos criopreservados ainda são limitados. Conforme relatado por Alteri e colaboradores8, há uma carência de informações abrangentes sobre o tema. No estudo de Cobo e colaboradores7, foi observado que apenas 12,1% das mulheres retornaram para utilizar seus oócitos, com um tempo médio de armazenamento de 2,1 anos. Além disso, uma pesquisa conduzida por Stoop e colaboradores9 revelou que 29,2% das mulheres indicaram que a probabilidade de usarem seus oócitos congelados era menor do que o inicialmente esperado no momento da coleta dos oócitos. Esses dados sugerem que, apesar do aumento na realização de criopreservação de oócitos, muitos fatores influenciam a decisão das mulheres de utilizar ou não os oócitos armazenados.

– Taxas de Sobrevivência e Fertilização: Estudos mostram que os oócitos vitrificados têm altas taxas de sobrevivência após o descongelamento, comparáveis às taxas de fertilização de oócitos frescos. As taxas de nascimentos vivos também são encorajadoras, embora variem de acordo com a clínica e a experiência do profissional.

– Resultados Clínicos: Dados clínicos de registros de FIV indicam que a criopreservação de oócitos pode resultar em taxas de gravidez e nascimentos vivos comparáveis às obtidas com oócitos frescos, especialmente em mulheres jovens.

 

Riscos e Complicações

Embora a criopreservação de oócitos seja geralmente segura, existem riscos associados ao procedimento que devem ser discutidos com as pacientes:

 

– Síndrome de Hiperestimulação Ovariana (SHO): A estimulação ovariana pode levar à SHO, uma condição potencialmente grave caracterizada por inchaço dos ovários e acúmulo de fluidos no abdômen.

– Complicações na Coleta de Oócitos: A aspiração transvaginal de oócitos pode causar dor, sangramento, infecção ou lesões nos órgãos adjacentes, embora esses riscos sejam baixos.

– Riscos Obstétricos: É importante destacar que a gravidez em idade avançada está associada a riscos obstétricos significativos. Esses riscos tendem a aumentar após os 45 anos, conforme relatado por Aoyama e colaboradores10. Mulheres que engravidam nessa faixa etária enfrentam maiores probabilidades de complicações como hipertensão gestacional, diabetes gestacional, parto prematuro e complicações no parto.

– Efeitos a Longo Prazo: Existem incertezas sobre os efeitos a longo prazo da criopreservação de oócitos tanto para a mulher quanto para os futuros filhos. Estudos a longo prazo são necessários para avaliar esses riscos de forma mais completa.

 

Criopreservação de Oócitos Patrocinada por Empresas

A oferta de criopreservação de oócitos patrocinada por empresas levanta questões éticas significativas. Entre elas estão a coerção e manipulação, onde as mulheres podem sentir-se pressionadas a adiar a maternidade para não comprometer suas carreiras. Goldman e Grifo11 e Mertes12 discutem que essa prática pode criar um ambiente onde as funcionárias sentem que não têm liberdade para tirar tempo do trabalho para ter filhos, reforçando a ideia de que o compromisso profissional deve preceder a vida pessoal. Assim, enquanto o benefício pode ser visto como uma forma de apoio à autonomia reprodutiva, é essencial considerar os potenciais impactos negativos e garantir que as mulheres não sejam sutilmente obrigadas a optar pela criopreservação devido a pressões corporativas.

 

Considerações Finais e Recomendações

Para otimizar a prática clínica da criopreservação eletiva de oócitos, as seguintes recomendações são sugeridas:

 

– Coleta de Dados e Pesquisa: Incentivar a coleta sistemática de dados e a realização de pesquisas clínicas para aprimorar o conhecimento sobre a eficácia, segurança e impactos a longo prazo do procedimento.

– Educação e Informação: Fornecer informações abrangentes e precisas às mulheres interessadas na criopreservação de oócitos, garantindo que compreendam todas as implicações do procedimento.

– Acesso Equitativo: Promover o acesso equitativo ao tratamento, independentemente da situação socioeconômica, para garantir que todas as mulheres tenham a oportunidade de preservar sua fertilidade.

– Apoio Psicossocial: Oferecer suporte psicológico antes, durante e após o procedimento para ajudar as mulheres a lidar com as emoções e decisões associadas à criopreservação de oócitos.

 

Referências

  1. Ethics Committee of the American Society for Reproductive Medicine. Planned oocyte cryopreservation to preserve future reproductive potential: an Ethics Committee opinion. Fertil Steril. 2024;121:604-12.
  2. ESHRE Task Force on Ethics and Law. Oocyte cryopreservation for age-related fertility loss. Hum Reprod. 2020;35(1):99-103.
  3. OECD Family Database. http://www.oecd.org/els/family/database.htm
  4. Baldwin K, Culley L, Hudson N, Mitchell H. Running out of time: exploring women’s motivations for social egg freezing. J Psychosom Obstet Gynaecol 2018: 1-8. 
  5. Stoop D, van der Veen F, Deneyer M, Nekkebroeck J, Tournaye H. Oocyte banking for anticipated gamete exhaustion (AGE) is a preventive intervention, neither social nor nonmedical. Reprod Biomed Online 2014;28: 548-551. 
  6. Eshre Task Force on Ethics Law, Dondorp W, de Wert G, Pennings G, Shenfield F, Devroey P, Tarlatzis B, Barri P, Diedrich K. Oocyte cryopreservation for age-related fertility loss. Hum Reprod 2012;27: 1231-1237. 
  7. Cobo A, Garcia-Velasco J, Domingo J, Pellicer A, Remohi J. Elective and Onco-fertility preservation: factors related to IVF outcomes. Hum Reprod 2018;33: 2222-2231. 
  8. Alteri A, Pisaturo V, Nogueira D, D’Angelo A. Elective egg freezing without medical indications. Acta Obstet Gynecol Scand 2019;98: 647-652. 
  9. Stoop D, Maes E, Polyzos NP, Verheyen G, Tournaye H, Nekkebroeck J. Does oocyte banking for anticipated gamete exhaustion influence future relational and reproductive choices? A follow-up of bankers and non- bankers. Hum Reprod 2015;30: 338-344. 
  10. Aoyama K, Pinto R, Ray JG, Hill AD, Scales DC, Lapinsky SE, Hladunewich MA, Seaward GR, Fowler RA. Association of Maternal Age With Severe Maternal Morbidity and Mortality in Canada. JAMA Netw Open 2019;2: e199875. 
  11. Goldman KN, Grifo JA. Elective oocyte cryopreservation for deferred childbearing. Curr Opin Endocrinol Diabetes Obes 2016;23: 458-464. 
  12. Mertes H. Does company-sponsored egg freezing promote or confine women’s reproductive autonomy? J Assist Reprod Genet 2015;32: 1205-1209. 

 

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