Comitê: Enfermagem

Oncofertilidade: preservação da fertilidade em pacientes oncológicos e o papel da enfermagem

Share on whatsapp
Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on email

ONCOFERTILIDADE: PRESERVAÇÃO DA FERTILIDADE EM PACIENTES  ONCOLÓGICOS E O PAPEL DA ENFERMAGEM 

Autores: Grazielle Viola, Mariane Félix 

Pontos-chaves 

– O câncer é considerado o principal problema de saúde pública no mundo e uma das  principais causas de mortes prematuras. 

– O impacto do câncer a nível global se torna evidente em relatório do Global Cancer  Observatory (Globocan) onde apontou que em 2020, 19.3 milhões de novos casos  ocorreram no mundo, sendo estimado que 1 em cada 5 indivíduos terá câncer em  alguma fase da vida. 

– O tratamento do câncer é realizado através de abordagem cirúrgica e/ou quimio radioterapia. E, dentre tantos efeitos colaterais dos tratamentos disponíveis, o possível  potencial gonadotóxico merece destaque e atenção. 

– A fertilidade pode ser afetada de diferentes maneiras a depender do tipo e estadiamento  do câncer diagnosticado, fase de vida, escolha terapêutica, dose e tempo de exposição  ao agente gonadotóxico. 

– Os guidelines, voltados para oncologia e fertilidade, recomendam atenção ao risco de  infertilidade e trazem uma série de recomendações aos profissionais de saúde que  atendem pacientes oncológicos. 

– A enfermagem atuante nas diversas fases do tratamento: dentro do serviço de oncologia,  no diagnóstico do câncer ou antes do início do tratamento oncológico, serviços de  fertilidade, consulta de enfermagem (acolhimento) e no seguimento pós tratamento  oncológico. 

Recomendações do Guideline da American Society of Clinical Oncology (ASCO): 

– População alvo: pacientes com câncer e risco de infertilidade devido ao tratamento  oncológico 

– Público alvo: enfermeiros, oncologistas, ginecologistas, urologistas, pediatras,  hematologistas, cirurgiões, psicólogos, assistente social, entre outros. 

– Homens adultos: 

– criopreservação de semen. 

– Mulheres adultas: 

– criopreservação de embriões, 

– criopreservação de óvulos, 

– criopreservação de tecido ovariano. 

– Protocolos de estimulação:  

– Flexíveis – não depende do ciclo menstrual, dessa forma iniciados com  menor atraso, 

– Atenção especial com malignidades ginecológicas e mamárias sensíveis  ao estrogênio – utilização de protocolos especiais sem aumento de risco  de recorrência de câncer como resultado da estimulação ovariana 

– Discussão da infertilidade como risco potencial da terapia oncológica, o mais rápido  possível, 

– Referenciar o paciente que demonstrar interesse ao especialista em Reprodução  Humana.

Discussão 

A incidência e mortalidade do câncer vêm aumentando devido ao crescimento e  envelhecimento populacional aliados à evolução médica, o que permitiu maior precisão e  precocidade diagnóstica. 

Os estudos apontam que poucos pacientes recebem informações sobre o risco à  fertilidade durante o tratamento oncológico e opções para preservá-la. A Sociedade Européia  de Reprodução Humana (ESHRE) estima que apenas 10 a 45% dos pacientes oncológicos em  idade fértil são referenciados aos serviços especializados de preservação da fertilidade. 

Os números são alarmantes e os desdobramentos psicossociais também. A preocupação  com o risco de infertilidade pós-tratamento oncológico faz com que o paciente tenha uma  redução em seu bem-estar psicológico e na aceitação da doença. A qualidade de vida pós câncer  também é impactada pois esses pacientes frequentemente vivenciam sentimento de perda e luto  e experienciam conflitos conjugais. 

Há diversas barreiras que impedem o acesso ao serviço especializado de preservação  da fertilidade de forma efetiva (Figura 1), os pacientes encontram barreiras intrínsecas onde o  foco e atenção são voltadas para o processo curativo do câncer o que pode impedir a projeção  de uma vida pós-câncer, aspectos culturais e religiosos, financeiros e legais também podem ser  apontados como limitantes; Aos profissionais oncológicos, as barreiras apontadas são falta de  conhecimento do tema e baixo nível de conforto para uma abordagem de orientação e referência  adequada dos pacientes aos serviços especializados em preservação da fertilidade; Quanto às instituições tem-se a falta de integração entre os serviços de oncologia e fertilidade com a  ausência de uma sistema de referenciação com fluxos de atendimento estabelecidos para que o  serviço ocorra de maneira efetiva e ágil. 

 

oncofertilidade e enfermagem
Figura 1. Barreiras para o acesso à preservação da fertilidade

 

Recomendações à equipe de Enfermagem para abordagem e atendimento às pacientes  oncológicas 

 

É preciso assumir uma visão biopsicossocioespiritual e apoio de uma equipe multidisciplinar  seja nos cuidados clínicos ou programas educativos. O enfermeiro assume posição privilegiada  na implementação dos cuidados e gestão dos efeitos relacionados ao tratamento oncológico. 

  1. Serviços Oncológicos  

– Elaborar e executar campanhas de conscientização ao paciente e profissionais acerca da  temática;

– Atuar na educação continuada e treinamento da equipe; 

– Estabelecer fluxos de atendimento; 

– Estabelecer sistema referência e contrarreferência; 

  1. Diagnóstico do câncer ou antes do início do tratamento oncológico 

– Avaliar risco de comprometimento da fertilidade diante das alternativas terapêuticas do  tratamento oncológico; 

– Orientar paciente e/ou responsável sobre risco à fertilidade durante tratamento oncológico e  consequente risco de infertilidade pós-tratamento; 

– Orientar sobre possibilidade de preservação da fertilidade, alternativas, riscos e benefícios  dos procedimentos; 

– Oferecer suporte emocional e encaminhar para atendimento psicossocial especializado, caso  necessário; 

– Encaminhar para serviço especializado de fertilidade; 

– Documentar todo o processo em prontuário; 

  1. Serviços de fertilidade 

Conhecer o público a ser atendido; 

– Estabelecer fluxo específico de atendimento à oncofertilidade; 

– Estabelecer e gerenciar programas de preservação da fertilidade; 

– Buscar alternativas para facilitação do acesso; 

– Atuar na educação continuada e treinamento da equipe; 

– Integrar a equipe multidisciplinar no atendimento e tratamento aos pacientes oncológicos;

  1. Consulta de enfermagem (acolhimento) 

– Realizar anamnese; 

– Oferecer suporte emocional e encaminhar para atendimento psicossocial especializado, caso  necessário; 

– Discutir e orientar opções de preservação da fertilidade, se aplicável; 

– Discutir infertilidade e tratamentos para reprodução assistida, se aplicável; 

– Discutir planejamento reprodutivo e opções para procriação/parentalidade incluindo doação  de gametas, se aplicável; 

– Discutir os aspectos necessários e esclarecer dúvidas acerca do tratamento médico prescrito:

  • Status da técnica no Brasil: estabelecida versus experimental; 
  • Tempo necessário para realização e etapas do processo; 
  • Riscos e benefícios do tratamento; 

– Identificar possíveis barreiras para acesso e/ou adesão ao tratamento prescrito; – Orientar preparo e realização de exames laboratoriais/imagem prescritos; – Orientar tratamento medicamentoso, se aplicável, como: 

  • Aquisição, transporte, manipulação, armazenamento e descarte do medicamento e  insumos; 
  • Preparo e administração de injetáveis; 
  • Efeitos locais e sistêmicos; 
  • Notificação de eventos adversos; 

– Orientar preparo para procedimento cirúrgico, se aplicável: 

– Orientar e esclarecer aspectos legais em relação ao armazenamento e destinação de gametas  e embriões em caso de morte ou incapacitação; 

– Documentar todo o processo em prontuário; 

  1. Seguimento pós tratamento oncológico 

– Discutir e orientar opções para preservação tardia, se aplicável; 

– Orientar riscos e benefícios da gestação após câncer e possíveis efeitos na prole; – Orientar riscos obstétricos 

Referências 

  1. Fertility preservation in patients undergoing gonadotoxic therapy or gonadectomy: a committee opinion. Fertility and Sterility 2019;112(6):1022–33.
  2. ESHRE Guideline Group on Female Fertility Preservation, Anderson RA, Amant F, et al. ESHRE guideline: female fertility preservation. Hum Reprod Open. 2020;2020(4):hoaa052. Published 2020 Nov 14. doi:10.1093/hropen/hoaa052 
  3. Oktay K, Harvey BE, Partridge AH, Quinn GP, Reinecke J, Taylor SH, et al. Fertility  Preservation in Patients With Cancer: ASCO Clinical Practice Guideline Update, 2018, Journal  of clinical oncology : official journal of the American Society of Clinical Oncology 36(19),  1994-2001. doi:10.1200/JCO.2018.78.1914 
  4. Brasil, Instituto Nacional de Câncer, Estimativa 2023: Incidência de câncer no Brasil.  Rio de Janeiro: INCA; 2022
  5. Brannigan R, Fantus RJ, Halpern JA. Fertility preservation in men: a contemporary  overview and a look toward emerging technologies, Fertility and sterility, 2021, 115(5), 1126- 1139. doi:10.1016/j.fertnstert.2021.03.026 
  6. Rocha ARDP, Lee EY, Reis HMJD, De Domenico EBL, Matsubara MDGS. Análises das  Demandas e Cenários de Apoio para Sobreviventes de Câncer: Revisão Integrativa. Revista  Brasileira de Cancerologia. 2021;67(4) 
  7. Neris RR, Nascimento LC. Childhood cancer survival: Emerging reflections on pediatric  oncology nursing. Rev Esc Enferm USP. 2021;55:e03761.

 

BAIXE O PDF DO ARTIGO