Comitê: Infertilidade

Marcadores de reserva ovariana – quando solicitar e como interpretar

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 Sofia Andrade de Oliveira 1,2, Raphael Haber de Souza 1,3

  1. Membro do Comitê de Infertilidade da SBRH
  2. Membro do corpo clínico de Reprodução Assistida do CENAFERT / EUGIN GROUP
  3. Membro do corpo clínico de Reprodução Assistida do Centro de Reprodução Nascer

 

Essa publicação aborda os principais marcadores de reserva ovariana, resumindo o último Guideline publicado pelo Comitê de Prática da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva (ASRM)

 

Introdução

A redução da reserva ovariana ocorre pelo processo de atresia folicular ao longo do envelhecimento da mulher. No entanto, entre as mulheres de mesma idade, existe uma variação da reserva, a depender de fatores genéticos e/ou ambientais. Para melhor entendimento de tal variação, os testes ou marcadores de reserva ovariana podem ser utilizados.

A avaliação da reserva ovariana, definida como o número de oócitos restantes nos ovários, é uma ferramenta importante para predizer a quantidade de folículos que irão se desenvolver em resposta à estimulação ovariana controlada (EOC) em ciclos de Fertilização in vitro, ou seja, os testes de reserva ovariana adicionam informações prognósticas ao processo de aconselhamento e planejamento do tratamento de reprodução assistida.

Os marcadores não devem ser utilizados para definir qualidade oocitária, nem para avaliar prognóstico em casais que planejam gravidez natural, visto que os marcadores de reserva ovariana são preditores ruins de potencial reprodutivo. Portanto, tais testes não devem ser usados, isoladamente, para indicar a criopreservação planejada de oócitos, por exemplo. As decisões relativas à criopreservação de oócitos devem ser baseadas nos planos reprodutivos e na idade da mulher. A idade é um preditor muito mais forte de sucesso reprodutivo do que a reserva ovariana.

 

Principais Marcadores de Reserva Ovariana

  • Contagem de folículos antrais (CFA): A CFA é um método ecográfico para analisar de modo direto a reserva ovariana, sendo idealmente realizada na fase folicular precoce, preferencialmente através da ultrassonografia transvaginal. É feita a contagem em ambos os ovários e a somatória dos folículos antrais, que são aqueles que medem entre 2 e 10 mm em diâmetro médio das maiores medidas no maior plano bidimensional do ovário. Possui baixa variabilidade entre os ciclos e alta confiabilidade quando realizada em centros experientes, já que é uma avaliação observador dependente.
  • Hormônio anti-mulleriano (AMH): tal hormônio é produzido pelas células da granulosa dos folículos primários, pré-antrais e antrais precoces e, portanto, a análise da reserva ovariana através desse marcador é feita de forma direta. Pode ser avaliado em qualquer fase do ciclo sem mudança do valor preditivo do teste, sendo uma grande vantagem do método. Trata-se de um teste mais sensível que o FSH e seus níveis tendem a reduzir antes da elevação do FSH. O resultado pode estar alterado – o nível tende a reduzir – em mulheres que utilizam contraceptivos hormonais.
  • Hormônio folículo estimulante (FSH): trata-se de um hormônio produzido pela adenohipófise. Sua análise como marcador de reserva ovariana é feita de forma indireta e o ideal é que a avaliação aconteça na fase folicular precoce, pois sofre bastante variação durante o ciclo menstrual. A relação do FSH com a reserva ovariana é inversamente proporcional, ou seja, quanto maior o nível, maior a necessidade ovariana de estímulo hormonal para que ocorra o desenvolvimento folicular, demonstrando menor reserva ovariana.  Tem como principais vantagens o fácil acesso e baixo custo e suas principais desvantagens são as variações intra-ciclo, a menor sensibilidade quando comparado com o AMH e a CFA e a grande influência que sofre com o uso de anticoncepcional hormonal.
  • Estradiol: é um marcador indireto de reserva ovariana. Também deve ser coletado na fase folicular precoce e só tem validade quando associado aos resultados dos níveis de FSH. Quando FSH normal e estradiol elevado pode sugerir baixa reserva ovariana. 
  • Inibina B: trata-se de hormônio produzido pelos folículos pré-antrais e, portanto, sua avaliação é direta. Deve ser coletado em fase folicular precoce e acaba sendo pouco utilizado na prática pela difícil disponibilidade de acesso. 

A combinação de testes de reserva ovariana não parece ser melhor que cada teste individualmente em predizer baixa resposta em tratamentos reprodutivos ou em taxa de nascidos vivos, nem para determinar dose de gonadotrofinas na FIV.

A CFA e a dosagem sérica do AMH são os marcadores mais recomendados para uso na prática diária, devido a facilidade de acesso, maior sensibilidade e especificidade, quando comparados aos outros testes de reserva ovariana.

Apesar de serem considerados bons para prever a resposta ovariana na FIV, os dados atuais não apoiam o uso do AMH e da CFA para recusa do início do tratamento, caso evidenciem baixa reserva. Portanto, valores extremamente baixos de AMH podem ser usados para aconselhar adequadamente as mulheres sobre a resposta ovariana à EOC e rendimento abaixo do ideal, mas não devem ser usados para impedir o tratamento. No entanto, apesar dos estudos serem conflitantes, de um modo geral, o AMH e a CFA, como variáveis independentes, parecem ser, fracamente, preditores de gravidez, de qualidade oocitária e taxa de nascido vivo.

 

Quando solicitar a avaliação de marcadores de reserva ovariana?

Ao cuidar de um casal com infertilidade, os médicos usam fatores como idade e diagnósticos para aconselhar pacientes individuais e adaptar o plano de tratamento. O objetivo dos testes de reserva ovariana é adicionar informações prognósticas ao aconselhamento e processo de planejamento para ajudar os casais a escolher entre as opções terapêuticas, uma vez que o teste de reserva ovariana indica apenas quantidade, e não a qualidade do conjunto de oócitos restantes. No entanto, é importante ressaltar que os testes de reserva ovariana não são infalíveis e não devem ser o único critério usado para negar à paciente acesso as tecnologias de reprodução assistida ou outros tratamentos. A evidência de baixa reserva ovariana não significa necessariamente incapacidade de conceber.

Marcadores de reserva ovariana não devem ser usados como testes de fertilidade para mulheres que não são inférteis ou que não tiveram a sua fertilidade testada. Consequentemente, os marcadores de reserva ovariana não devem ser usados para promover a criopreservação planejada de oócitos. As decisões relativas à criopreservação de oócitos devem ser tomadas com base nos planos reprodutivos e na idade da mulher. A idade é uma preditor muito mais forte do sucesso reprodutivo do que reserva ovariana. Todos os prestadores de cuidados de saúde são encorajados a conversar com seus pacientes sobre seus planos reprodutivos em todas as fases da vida reprodutiva. Abrindo este diálogo e educar os pacientes facilita sua tomada de decisão.

 

Referências:

Practice Committee of the American Society for Reproductive Medicine. Testing and interpreting measures of ovarian reserve: a committee opinion. Fertil Steril 2020 Dec;114(6):1151-1157.

Grisendi V, Mastellari E, La Marca A. Ovarian Reserve Markers to Identify Poor Responders in the Context of Poseidon Classification. Front Endocrinol (Lausanne). 2019 May 8:10:281.

 

Tabela Resumo – Marcadores de reserva ovariana

Marcador

de reserva ovariana

Fase do ciclo menstrual para avaliação Relação com o estoque folicular Característica
AMH Qualquer fase do ciclo Direta (produzido pelas células da granulosa dos folículos primários, pré-antrais) e antrais precoces).  Mais sensível que o FSH e tende a reduzir na baixa reserva ovariana antes da elevação de FSH. Pode estar reduzido em mulheres que utilizam contraceptivos hormonais. 
Contagem de folículos antrais Idealmente na fase folicular precoce Direta (soma do número de folículos antrais – entre 2 e 10 mm – em ambos os ovários visualizados à ultrassonografia) Possui baixa variabilidade entre os ciclos e alta confiabilidade quando realizada em centros experientes, já que é uma avaliação observador dependente. 
FSH Folicular precoce Indireta (FSH elevado sugere baixa reserva ovariana) Específico, porém não muito sensível. Varia muito conforme a fase do ciclo.
Estradiol Folicular precoce Indireta (FSH normal e estradiol elevado sugerem baixa reserva ovariana) Só tem validade quando associado ao resultado das concentrações séricas de FSH.
Inibina B Folicular precoce Direta (produzida pelos folículos pré-antrais) Em desuso pela dificuldade de acesso.

Nota. Practice Committee of the American Society for Reproductive Medicine. Electronic address: asrm@asrm.org; Practice Committee of the American Society for Reproductive Medicine. Testing and interpreting measures of ovarian reserve: a committee opinion. Fertil Steril. 2020 Dec;114(6):1151-1157.

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