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Comitê: Ginecologia Endócrina

Síndrome dos Ovários Policísticos: semiologia e diagnóstico

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Autores: José Maria Soares Júnior, Edmund Chada Baracat, Mário Vicente Giordano, Cristina Laguna Benetti Pinto, Paula Navarro e membros da Comissão de Ginecologia Endócrina da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana

 

INTRODUÇÃO

A síndrome do ovário policístico (SOP) é uma das afecções mais frequentes durante o período reprodutivo. Sua prevalência varia de 3% a 15% em mulheres em todo o mundo [1]. Está associada a irregularidade menstrual, hiperandrogenismo, subfertilidade, obesidade e distúrbios metabólicos (lipídeos e carboidratos), o que torna o diagnóstico e acompanhamento complexos em muitos casos [2,3]. Portanto, uma diretriz internacional baseada em evidências, atualizada em 2023 [4], propõe critérios para o diagnóstico na adolescência e na idade adulta. 

 

DIAGNÓSTICO

Em geral, o principal diagnóstico diferencial na adolescência é a disfunção ovulatória devido à imaturidade do eixo córtico-hipotálamo-hipófise-ovariano, sendo um processo habitualmente temporário [5]. Portanto, recomendamos não confirmar o diagnóstico de SOP antes de dois anos após a menarca e colocar a adolescente como risco de SOP. Contudo, antecedentes pessoais podem auxiliar, como a pubarca precoce, que pode ser considerada como primeiro sinal de predisposição à SOP na infância [6]. Salienta-se que a ultrassonografia na adolescência não é útil, pois os ovários geralmente são maiores e multifoliculares quando há imaturidade do eixo.  Portanto, não recomendamos a ultrassonografia pélvica antes dos oito anos após a menarca, quando há quadro clínico evidente [3-4].

Na disfunção ovulatória comumente identificada na adolescência, ocorre irregularidade menstrual caracterizada por: a) ciclos menstruais menores de 21 dias ou maiores do que 45 dias até o terceiro ano após a menarca; b) ciclos menstruais menores de 21 dias ou maiores do que 35 dias após o terceiro ano da menarca; c) amenorreia primária (que é mais raro de ocorre na SOP) ou secundária (mais de 90 dias). Este parâmetro pode ser considerado o primeiro passo para o diagnóstico de SOP [3-4]. 

O exame físico pode auxiliar no diagnóstico; portanto, deve-se buscar sinais clínicos de hiperandrogenismo, como acne, hirsutismo e alopecia (frontal e central). A mera presença de hipertricose não implica necessariamente em aumento da ação dos androgênios, pois são pelos do tipo lanugem que geralmente aparecem na face [7]. Em geral, a acne não apresenta um padrão característico, mas o hirsutismo pode ser caracterizado pelo índice de Ferriman-Gallwey-Lorenzo: a) valores maiores ou iguais a seis são observados em mulheres afrodescendentes e brancas; b) pontuação total acima de quatro é considerado como hirsutismo em mulheres asiáticas orientais (japonesas, coreanas e chinesas). A alopecia hiperandrogênica na SOP é definida como frontal e central, sendo avaliada pela escala de Ludwig em três graus: I- leve; II – moderada; III – acentuada [3-4]. Estes achados clínicos de hiperandrogenismo são tanto ou mais relevantes do que as dosagens de androgênios. Casos mais intensos de hiperandrogenismo, com evolução rápida e virilização, indica a investigação de neoplasias produtores de androgênios. Geralmente, a evolução clínica da SOP é mais lenta e prolongada, começando na adolescência e, em muitos casos, piorando gradualmente com a ocorrência de obesidade e resistência à insulina [8].

Apesar de não fazer parte do diagnóstico, sinais clínicos que mostram morbidades associadas são importantes para a terapêutica adequada da mulher com SOP.  Em relação à resistência à insulina, o sinal clínico mais importante é a acantose nigricans (ou nigra), que é um espessamento e escurecimento da pele em áreas de dobras. É efeito do excesso de insulina sobre o tecido cutâneo, principalmente na região cervical posterior [9]. O clareamento destas áreas está associado com melhora da sensibilidade insulínica. 

Durante o exame ginecológico, os ovários podem apresentar aumento de tamanho, uni ou bilateral. Contudo, a identificação de massa pélvica ou abdominal deve ser complementada com exames de imagem.  Em casos raros, pode-se encontrar aumento do clitóris, que é mais frequente nos casos de neoplasias produtoras de androgênios [10]. 

O ultrassom pélvico pode revelar imagens de ovários com volume aumentado, geralmente acima de 10 cc3 (ou mL) e/ou com mais de 20 microcistos (menores que 1 cm com transdutor de 8 MHz) na periferia do ovário [3,4]. No entanto, uma característica marcante é a hiperecogenicidade central, que reflete a hiperplasia estromal, ainda não bem caracterizada na literatura [11]. Contudo, o ultrassom por si só não é suficiente para diagnosticar SOP e quando não for possível o emprego de ultrassom endovaginal, deve-se valorizar o volume ovariano pela imagem pélvica transabdominal. 

O Consenso mais utilizado atualmente é o de Rotterdam, de 2003 [3,4], que estabelece três critérios: a) estado de hiperandrogenismo cutâneo ou bioquímico; b) anovulação crônica; c) imagens sugestivas de micropolicistose ovariana (morfologia) ou hormônio antimulleriano (este último citado no Consenso 2023 [4]). Para o diagnóstico são necessários pelo menos dois dos três critérios. Assim, este critério estabelece quatro fenótipos de mulheres com SOP: A – clássico ou completo com as três características; B – anovulação com hiperandrogenismo, mas sem imagens de ovários policísticos; C – hiperandrogenismo com imagens de ovários policísticos, porém, a paciente apresenta ciclos menstruais regulares (ovulatório); D – a paciente não apresenta hiperandrogenismo. Os fenótipos mais comuns são A e B, correspondendo a aproximadamente 80% das mulheres com SOP. Portanto, o diagnóstico final é baseado nos critérios de Rotterdam, após excluir as afecções que possuem quadro clínico semelhante ao da SOP. Os critérios C e D são ainda motivos de debates [12].

Embora na revisão da diretriz internacional baseada em evidências, recomende-se o emprego do hormônio antimulleriano para o diagnóstico de SOP, o valor de corte é motivo de debate. Há um estudo em países nórdicos que definiram cifras acime de 3,2 ng/mL [13]. Desta forma, a utilidade desta dosagem ainda é questionável.

 

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

Outras afecções têm manifestações clínicas semelhantes à SOP, como disfunção tireoidiana, hiperprolactinemia, tumores ovarianos ou adrenais, defeitos na síntese de androgênios adrenais, síndrome de Cushing e uso de substâncias androgênicas (anabolizantes). Portanto, o diagnóstico de SOP estará presente após descartarmos tais afecções.

Os principais exames complementares utilizados para afastar outras condições que apresentam quadros clínicos similares são: TSH e T4 (disfunção tireoidiana), prolactina (hiperprolactinemia), testosterona total (tumor ovariano ou adrenal), 17OH-progesterona (deficiência enzimática da adrenal – 21-hidroxilase) e cortisol (síndrome de Cushing) [3-4].  Quando a dosagem de testosterona estiver acima de 200 ng/dL deve-se investigar tumor produtor de androgênios. Esta dosagem também pode ser auxiliar no diagnóstico de SOP, quando o hiperandrogenismo cutâneo não for evidente. 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 – Bozdag G., Mumusoglu S., Zenginet D., et al. The prevalence and phenotypic features of polycystic ovary syndrome: a systematic review and meta-analysis. Hum Reprod. 2016;31:2841–2855;

2 – Soares Júnior JM, Baracat MC, Maciel GA, Baracat EC. Polycystic ovary syndrome: controversies and challenges. Rev Assoc Med Bras (1992). 2015 Nov-Dec;61(6):485-7. doi: 10.1590/1806-9282.61.06.485. PMID: 26841154.

3 – Teede HJ, Misso ML, Costello MF, Dokras A, Laven J, Moran L, Piltonen T, Norman RJ; International PCOS Network. Recommendations from the international evidence-based guideline for the assessment and management of polycystic ovary syndrome. Fertil Steril. 2018 Aug;110(3):364-379. doi: 10.1016/j.fertnstert.2018.05.004. Epub 2018 Jul 19. PMID: 30033227; PMCID: PMC6939856.

4 – Teede HJ, Tay CT, Laven J, Dokras A, Moran LJ, Piltonen TT, Costello MF, Boivin J, M Redman L, A Boyle J, Norman RJ, Mousa A, Joham AE; International PCOS Network. Recommendations from the 2023 International Evidence-based Guideline for the Assessment and Management of Polycystic Ovary Syndrome. Fertil Steril. 2023 Oct;120(4):767-793. doi: 10.1016/j.fertnstert.2023.07.025. Epub 2023 Aug 14. PMID: 37589624.

5 – Deligeoroglou E, Creatsas G. Menstrual disorders. Endocr Dev. 2012;22:160-170. doi: 10.1159/000331697. Epub 2012 Jul 25. PMID: 22846527.

6 – Guarnotta V, Lucchese S, Mineo MI, Mangione D, Venezia R, Almasio PL, Giordano C. Predictive factors of polycystic ovary syndrome in girls with precocious pubarche. Endocr Connect. 2021 Jul 21;10(7):796-804. doi: 10.1530/EC-21-0118. PMID: 34138747; PMCID: PMC8346197.

7 – Doolan BJ, Rayinda T, Chiu FP, McGrath JA, Onoufriadis A. A review of genotrichoses and hair pathology associated with inherited skin diseases. Br J Dermatol. 2023 Jul 17;189(2):154-160. doi: 10.1093/bjd/ljad102. PMID: 36978220.

8 – Soares-Jr JM, Hayashida SAY, Marcondes JAM, Maciel GAR, Barcellos CRG, Maffazioli GN, Monteiro KKAC, Turri JAO, Azziz R, Baracat EC. Influence of Phenotypes on the Metabolic Syndrome of Women with Polycystic Ovary Syndrome over a Six-Year Follow-Up in Brazil. Biomedicines. 2023 Dec 9;11(12):3262. doi: 10.3390/biomedicines11123262. PMID: 38137483; PMCID: PMC10741024.

9 – Enwereji N, Mallett J. Concomitant confluent and reticulated papillomatosis and acanthosis nigricans in patients with skin of color and need for early interventions for insulin resistance. Int J Womens Dermatol. 2023 Nov 3;9(4):e119. doi: 10.1097/JW9.0000000000000119. PMID: 37927368; PMCID: PMC10617815.

10 – Wei CH, Fadare O. Ovarian steroid cell tumors: what do we know so far? Front Oncol. 2024 Jan 30;14:1331903. doi: 10.3389/fonc.2024.1331903. PMID: 38352891; PMCID: PMC10861727.

11 – Balen AH, Laven JS, Tan SL, Dewailly D. Ultrasound assessment of the polycystic ovary: international consensus definitions. Hum Reprod Update. 2003 Nov-Dec;9(6):505-14. doi: 10.1093/humupd/dmg044.

12 – Baracat EC, Baracat MCP, José M SJ Jr. Are there new insights for the definition of PCOS? Gynecol Endocrinol. 2022 Sep;38(9):703-704. doi: 10.1080/09513590.2022.2121387. Epub 2022 Sep 14. PMID: 36102342.

13 – Piltonen TT, Komsi E, Morin-Papunen LC, Korhonen E, Franks S, Järvelin MR, Arffman RK, Ollila MM. AMH as part of the diagnostic PCOS workup in large epidemiological studies. Eur J Endocrinol. 2023 Jun 7;188(6):547-554. doi: 10.1093/ejendo/lvad065. PMID: 37294941.

 

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