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Comitê: Infertilidade

Protocolo de Prevenção da Síndrome de Hiperestimulação Ovariana Moderada e Grave

Protocolo de Prevenção da Síndrome de Hiperestimulação Ovariana Moderada e Grave
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Autores: George Vaz1,2, Thomaz Gabriel Miklos1,3, Paula Andrea Navarro4,5.

  1. Membro do Comitê de Infertilidade da SBRH
  2. Professor assistente da disciplina de Ginecologia da Faculdade de Ciências Médicas

da Universidade Estadual do Rio de Janeiro

  1. Professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo e

Universidade Santo Amaro

  1. Coordenadora do Comitê de Infertilidade da SBRH
  2. Professora Associada do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de

Medicina de Ribeirão Preto-USP, Setor de Reprodução Humana

 

RECOMENDAÇÕES

 

  • Recomenda-se informar e aconselhar as pacientes com nível de hormônio antimülleriano elevado, síndrome dos ovários policísticos (SOP) e com previsão de alta produção de óvulos, sobre o maior risco para síndrome de hiperestímulo ovariano (SHO) que elas se encontram. Intervenções para reduzir o risco de SHO devem ser focadas nesta população de pacientes. (Força de evidência: nível A; força da recomendação: forte)

 

  • Recomenda-se o emprego de protocolos de estimulação ovariana usando antagonistas do GnRH ao invés de protocolos com agonistas do GnRH, quando existe uma preocupação com a SHO. (Força de evidência: nível A; força da recomendação: forte)

 

  • Recomenda-se ajustar a dose de gonadotrofinas baseado na individualização de acordo com testes de reserva ovariana para diminuir o risco de SHO. (Força de evidência: nível B; força da recomendação: moderado)

 

  • Recomenda-se considerar a diminuição da dose inicial de gonadotrofinas e/ou indutores orais da ovulação (citrato de clomifeno e/ou letrozol) para diminuir o risco de SHO. (Força da evidência: nível B; força da recomendação: moderada)

 

  • O uso do Coasting geralmente não é recomendado como principal estratégia para reduzir o risco de SHO moderada a grave. No entanto, quando outras estratégias eficazes não estão mais disponíveis para reduzir o risco de SHO, realizar o coasting em combinação com cabergolina e o congelamento total de embriões  pode diminuir  o risco. (Força de evidência: nível C; força da recomendação: fraco)

 

  • Recomenda-se usar um agonista do GnRH para desencadear a maturação do oócito (trigger) como estratégia de primeira linha para reduzir risco de SHO moderada a grave. (Força da evidência: nível A; força de recomendação: forte)

 

  • Recomenda-se adicionar suporte lúteo adequado ao usar agonista do GnRH como trigger, em uma FIV com planejamento de transferência de embriões a frescos. (Força de evidência: nível A; força da recomendação: forte)

 

  • Não é recomendado usar no trigger doses menores de hCG como estratégia única para reduzir o risco de SHO moderada a grave. (Força de evidência: nível C; força de recomendação: fraca)

 

  • Em pacientes com risco de SHO moderada a grave, recomenda-se iniciar um agonista da dopamina, como a cabergolina no dia do trigger com hCG ou logo depois e continuar por vários dias. (Força de evidência: nível A; força de recomendação: forte)

 

  • Não é recomendado administrar letrozol como uma intervenção para reduzir taxas de SHO moderada a grave. (Força da evidência: nível B; força de recomendação: moderado)

 

  • Não é recomendado administrar antagonista do GnRH na fase lútea como estratégia única para reduzir as taxas de SHO moderada a grave. (Força da evidência: nível C; força da recomendação: fraca)

 

  • Não é recomendado usar aspirina como estratégia primária para reduzir a incidência de SHO. (Força da evidência: nível C; força da recomendação: fraca) 

 

  • Não é recomendado administrar metformina com objetivo de reduzir a incidência de SHO em protocolos com antagonistas do GnRH. Entretanto a metformina pode ser considerada para redução do risco de SHO em mulheres com SOP utilizando protocolo com agonista de GnRH. (Força de evidência: nível B; força da recomendação: moderada)

 

  • Não é recomendado administrar medicamentos como mifepristona, mioinositol, D-quiro-inositol ou glicocorticóides para reduzir as taxas de SHO. (Força da evidência: nível C; força da recomendação: fraca)

 

  • Recomenda-se considerar a estratégia de ciclos de congelamento total dos embriões e subsequentes transferências de embriões congelados em pacientes com risco de SHO com base em uma alta resposta ovariana ou níveis séricos elevados de estradiol. (Força de evidência: nível A; força da recomendação: forte)

 

  • Não é recomendado usar expansores de volume como albumina, hidroxietilamido ou manitol em pacientes que apresentam alto risco de desenvolver SHO moderada ou grave. (Força da evidência: nível C; força da recomendação: fraco)

 

INTRODUÇÃO

A Síndrome de Hiperestímulo Ovariano (SHO) é uma complicação incomum, entretanto grave, associada à estimulação ovariana controlada durante técnicas de reprodução assistida (TRA). Historicamente, a SHO moderada a grave tem sido relatada ocorrendo em aproximadamente 1% a 5% dos casos de ciclos de fertilização in vitro (FIV). No entanto, a verdadeira incidência é difícil de delinear devido a uma falta de definição estrita e consensual.  

A descrição tradicional da síndrome geralmente inclui um espectro de sintomas, incluindo distensão e desconforto abdominal, dispneia e achados como aumento ovariano, ascite, hemoconcentração, hipercoagulabilidade e desequilíbrios eletrolíticos. Compreender a fisiopatologia desta condição pode auxiliar na identificação de medidas para prevenir seu desenvolvimento e tratar sintomas associados. As alterações fisiológicas clássicas da SHO incluem vasodilatação arteriolar e aumento da permeabilidade capilar, levando ao um extravasamento do fluido de intravascular para espaços extravasculares, resultando assim, em um estado de depleção do volume intravascular e hiponatremia. O fator de crescimento endotelial vascular (VEGF) parece ser parte integrante do desenvolvimento desta condição e está envolvido no desenvolvimento do crescimento folicular, na função do corpo lúteo, na angiogênese e na estimulação endotelial. Em resposta à gonadotrofina coriônica humana (hCG), o VEGF parece mediar a permeabilidade vascular na SHO, como níveis sistêmicos de hCG correlacionando-se positivamente com a gravidade da doença.

A síndrome de hiperestímulo ovariano é classificada em leve, moderada, grave ou crítica de acordo com a gravidade dos sintomas e achados laboratoriais (Tabela 1), podendo ser ainda classificada pelo momento do seu início como precoce ou tardia. SHO de início precoce ocorre após hiperestimulação ovariana controlada e uso de trigger ovulatório com hCG. Sintomas começam 4 a 7 dias após o uso do hCG e geralmente desaparecem com a menstruação. SHO de início tardio normalmente começa em pelo menos 9 dias após o disparo do hCG em resposta ao aumento do hCG da gravidez, é mais grave e com curso significativamente  prolongado da SHO. SHO grave pode levar a complicações e risco de vida, incluindo derrame pleural, insuficiência renal aguda e tromboembolismo venoso.

 

Tabela 1  Classificação da Síndrome de Hiperestimulação Ovariana.

 

Classificação Características Clínicas Características bioquímicas
Leve Distensão abdominal

Náusea e vômito

Diarréia

Aumento do volume ovariano

Sem achados

laboratoriais importantes

 

Moderado Presença dos sinais da classificação leve +

Presença de ascite ao ultrassom

Ht > 41%

Leucócitos > 15.000/mL

Hipoproteinemia

Grave Presença das características leve e moderada mais:

Evidência clínica de ascite

Dor abdominal severa

Náusea e vômitos que não respondem ao tratamento

Ganho rápido de peso (>1kg em 24h)

Derrame pleural

Dispnéia grave

Oligúria / anúria

Pressão venosa central baixa

Síncope

Trombose venosa

Ht >55%

Leucócitos > 25.000

Cr > 1,6 mg/dL

Na < 135 mEg/L

K > 5 mEg/L

Enzimas hepáticas aumentadas

Crítica

Comprometimento funcional de órgãos vitais

Presença das características graves,

mais:

Anúria / IRA

Arritmia

Derrame pericárdico

Hidrotórax maciço

Tromboembolismo

Sepsis / SARA / CIVD

Piora de todos os parâmetros

encontrados na forma grave

     

 

Este documento é uma tradução resumida do guideline: Prevenção da  Síndrome de Hiperestímulo  Ovariano  Moderada e Grave,  da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva (ASRM), baseada em uma revisão sistemática rigorosa da  literatura médica publicada no final de 2023. 

O documento original está disponível na íntegra no endereço eletrônico:  https://www.asrm.org/practice-guidance/practice-committee-documents/prevention-and-treatment-of-moderate-and-severe-ovarian-hyperstimulation-syndrome-a-guideline/?_t_tags=siteid:01216f06-3dc9-4ac9-96da-555740dd020c,language:en&_t_hit.id=ASRM_Models_Pages_ContentPage/_338e92af-4aaa-494a-8697-08d6e64a2095_en&_t_hit.pos=2.

Esta diretriz de prática clínica foi baseada em revisão sistemática da literatura e seguiu um protocolo metodológico estabelecido pela Equipe de Medicina da Sociedade Americana de Reprodução para formular questões específicas relacionados à prática clínica e tratamentos baseados em evidências para SHO e os estudos selecionados tiveram a força e as limitações das evidências avaliadas criticamente por membros de uma  força-tarefa do  Comitê de Práticas da  ASRM e classificados quanto a  qualidade da evidência (alta qualidade;   qualidade intermediária e baixa qualidade) e a força da evidência ( nível A –  Alta confiança na evidência, nível  B – moderada confiança na evidência e nível C – baixa confiança na evidência).

 

QUAL PACIENTE ESTÁ EM ALTO RISCO PARA SHO MODERADA E GRAVE?

 

A síndrome de hiperestimulação ovariana poderia teoricamente ocorrer em qualquer mulher submetida a estimulação ovariana controlada com gonadotrofinas. No entanto, as evidências indicam que algumas mulheres possuem um risco aumentado.  Limites sugeridos para identificar fatores de risco para SHO com base em estimativas conservadoras da literatura são apresentados na Tabela 2. 

A identificação de pacientes com maior risco para SHO, facilita a implementação de estratégias para diminuir ou eliminar sua incidência. Além disso, através da identificação precoce, as pacientes podem ser direcionadas para tratamento adequado e aconselhamento prévio sobre o risco. 

 

Demografia, características básicas

As características basais da paciente são úteis na avaliação do risco de SHO e podem permitir um aconselhamento precoce e uma diminuição do risco antes do tratamento.  Pacientes com idade mais jovem, raça negra e infertilidade por distúrbios de ovulação, fator tubário ou infertilidade sem causa aparente estão associados ao risco aumentado de SHO. Embora a idade mais jovem esteja associada a um risco aumentado de SHO, entre indivíduos hospitalizados com SHO, idade > 40 anos tem sido associada a um aumento do risco de complicações potencialmente fatais.  Distúrbios da ovulação, incluindo principalmente a síndrome dos ovários policísticos (SOP), têm sido consistentemente associadas a uma maior incidência de SHO. Entre as mulheres com SOP, aquelas com síndrome metabólica parecem estar em menor risco de SHO do que aquelas sem. Finalmente, preditores genéticos do risco de SHO estão sendo aventados mais recentemente como a variante N680S do receptor de hormônio folículo-estimulante (FSH) e variantes no gene FLT4.

 

Marcadores de reserva ovariana

Embora a demografia possa fornecer dados preliminares para estratificação de risco, os marcadores de reserva ovariana consistentemente provam ser melhores preditores do risco de SHO. Antes do tratamento, níveis de hormônio antimülleriano (AMH) e contagem de folículos antrais (CFA) foram estudados como marcadores de resposta à estimulação ovariana, com vários limiares sugerindo um risco elevado de SHO.

Um nível elevado de AMH prevê consistentemente o risco de SHO, entretanto os limites para os níveis de AMH são difíceis de determinar e devem ser interpretados com cautela, dada a evolução e variedade de ensaios clínicos. Níveis de AMH > 3,36 ng/mL tem uma sensibilidade e especificidade de 90,5% e 81,3% respectivamente em predizer SHO.  

A contagem de folículos antrais está intimamente relacionada aos níveis de AMH como marcador de reserva ovariana e demonstrou ter também uma relação semelhante com o risco de SHO. Uma CFA > 24 foi associada a um maior risco SHO em comparação com mulheres com CFA < 24.

 

Fatores relacionados à estimulação

Embora antes do tratamento a identificação de pacientes com risco aumentado de SHO seja o mais desejável, alguns fatores relacionados à estimulação podem revelar aquelas em risco de SHO iminente. Um maior número de folículos maduros no período do gatilho/trigger ovulatório, pico elevado de estradiol ou um número elevado de oócitos recuperados demonstraram aumentar o risco para SHO. 

 

Resumo – Tabela 2

  • Há fortes evidências de que fatores associados a uma resposta robusta à estimulação ovariana predispõem a SHO. Isso inclui características básicas, como idade mais jovem e o diagnóstico de SOP, além de marcadores elevados de reserva ovariana, incluindo CFA (>24) e níveis de AMH (>3,4 ng/mL). (Nível A)
  • Há fortes evidências associando SHO com fatores relacionados à estimulação, como um número elevado de folículos maiores de 10 mm (> 17–19) na época do gatilho/trigger ovariano, níveis elevados estradiol (>3.500–5.000 pg/mL) ná época do gatilho/trigger ovariano e um aumento do número de oócitos recuperados (> 15–18). (Nível A)
  • Não há evidências suficientes de que uma predisposição genética pode desempenhar um papel na propensão para OHSS. (Nível C)

 

Recomendação

  • Recomenda-se aconselhar pacientes com níveis elevados de AMH, SOP e com previsão de alta produção oocitária, de que elas apresentam risco aumentado de SHO. 
  • Estratégias para reduzir o risco de SHO devem ser implementadas nesta população de pacientes (Força da evidência: Nível A; força da recomendação: forte)

 

Tabela 2 – Fatores de risco para síndrome de hiperestímulo ovariano

 

Fatores de risco basal Fatores de risco durante a estimulação ovariana
SOP >17 folículos maiores que 10 mm no dia do trigger
História prévia de SHO Estradiol > 3500 pg/ml no dia do trigger
CFA > 24 >15 oócitos coletados
AMH > 3,4 ng/ml  

SOP = Síndrome dos ovários Policísticos; CFA = contagens de folículos antrais;  AMH  = Hormônio Anti Mulleriano 

 

PREVENÇÃO DA SÍNDROME DE HIPERESTÍMULO OVARIANO

 

O tipo de protocolo de estimulação influencia o risco de SHO?

 

Protocolos com agonista do hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH) vs.  protocolos com antagonistas. Existem estudos demonstrando que protocolos de estimulação utilizando antagonistas de GnRH para supressão da ovulação reduzem a incidência de SHO quando comparados com protocolos que utilizam agonista de GnRH, independente do tipo de gatilho, incluindo grandes ensaios clínicos controlados e randomizados (RCTs) e uma revisão sistemática e metanálise da Cochrane com 73 RCTs, com 12.212 participantes.

 

Doses individualizadas de gonadotrofinas com base no teste de reserva vs. doses fixas de gonadotrofinas. Existem estudos demonstrando que protocolos com doses individualizadas reduzem a incidência de SHO, sem diferenças significativas nas taxas de nascidos vivos, quando comparados a protocolos com doses fixas padronizadas, incluindo grandes ensaios RCTs e uma revisão sistemática e metanálise com 20 RCTs.

 

Reduzir a dose de gonadotrofinas e/ou suplementar com agentes indutores de ovulação orais. Um estudo de coorte retrospectiva demonstrou que protocolos com redução das doses de gonadotrofinas durante o estímulo apresentavam menor incidência de SHO quando comparados com protocolos de doses fixas. Uma meta-análise da Cochrane, incluindo 5 estudos comparando indutores orais da ovulação (letrozol e/ou citrato de clomifeno) com ou sem gonadotrofinas revelou uma diminuição significativa na incidência de SHO com uso de indutores orais em comparação com gonadotrofinas isoladas. 

 

Resumo

  • Existem fortes evidências que apoiam o uso de protocolos com antagonistas de GnRH ao invés de protocolos com agonistas de GnRH em estímulos ovarianos controlados para diminuir o risco de SHO. (Nível A)
  • Existem evidências moderadas para apoiar a individualização das doses de gonadotrofinas com base no teste de reserva ovariana em comparação com protocolos de doses padronizadas para diminuir o risco de SHO. (Nível B)
  • Existem evidências moderadas de que a redução da dose inicial de gonadotrofinas e/ou suplementação com indutores orais da ovulação (citrato de clomifeno e/ou letrozol) podem diminuir o risco de SHO. (Nível B)

 

Recomendação

  • Recomenda-se empregar protocolos de estimulação ovariana usando antagonistas de GnRH em vez de protocolos usando agonistas de GnRH quando existe a preocupação com SHO. (Força da evidência: A; força da recomendação: forte).
  • Recomenda-se individualizar a dose de gonadotrofinas com base nos testes de reserva ovarianos para diminuir o risco de SHO. (Força da evidência: B; força da recomendação: moderada). 
  • Recomenda-se considerar a redução da dose inicial de gonadotrofinas e/ou suplementação com indutores de ovulação oral medicamentos (citrato de clomifeno e/ou letrozol) para diminuir o risco de SHO. (Força da evidência: B; força da recomendação: moderada).

 

COASTING PODE REDUZIR O RISCO DE SHO?

 

O ‘‘coasting’’ é usado quando há um alto risco de SHO com base nos níveis de estrogênio e no número de folículos. Coasting envolve a parada da administração de gonadotrofinas até os níveis de estradiol e os tamanhos dos folículos estarem apropriados para o gatilho final da maturação dos ovócitos.

A duração ideal do coasting não foi determinada, com estudos de coorte sugerindo que um coasting maior ou igual a 4 dias diminui as taxas de implantação. Um RCT com 300 mulheres encontrou uma redução significativa na incidência SHO com o uso de coasting combinado com carbegolina. 

 

Resumo

Há evidências fracas para recomendar o coasting para a prevenção da SHO. (Nível C)

 

Recomendação

O coasting geralmente não é recomendado como principal estratégia para reduzir o risco de SHO moderada a grave. No entanto, quando outras estratégias mais eficazes não estão disponíveis para reduzir o risco de SHO, o coasting em combinação com a cabergolina e o congelamento de todos os embriões formados e/ou oócitos pode diminuir riscos. (Força da evidência: C; força da recomendação: fraca)

 

ESCOLHA DO TRIGGER PARA MATURAÇÃO DO OÓCITO ANTES DA ASPIRAÇÃO FOLICULAR

 

O ‘‘gatilho’’ é a ativação do receptor do hormônio luteinizante (LH) durante uma janela de 24 a 36 horas, mimetizando o pico de LH para induzir a maturação final do oócito antes da aspiração folicular. Uma única injeção de hCG ativa adequadamente o receptor de LH. A administração de gonadotrofina coriônica humana foi o padrão de tratamento por décadas até que o uso de agonistas de GnRH foi introduzido para induzir um aumento endógeno de LH por meio do seu efeito flare-up. O hCG humano tem meia-vida mais longa que o LH, levando à estimulação sustentada do receptor de LH mesmo após a aspiração folicular. 

Redução nas dosagens de hCG e administração de agonistas de GnRH sozinhos ou em combinação com hCG têm sido amplamente investigados como métodos para reduzir SHO.  A redução da dose do gatilho de hCG para 4.000 UI em comparação com 6.000 UI ou 10.000 UI foi examinada em RCTs sem encontrar resultados consistentes ou diferenças estatisticamente significantes nas taxas de SHO. 

Existem muitos estudos que avaliam a ocorrência de SHO em mulheres que fizeram o gatilho com agonista do GnRH em comparação com o gatilho de hCG para a maturação final do oócito. Isto inclui vários RCTs que fornecem fortes evidências que o gatilho com agonista de GnRH resulta em uma redução significativa no desenvolvimento de SHO. A maioria desses estudos foi realizada em mulheres com alto risco de SHO, incluindo doadoras de oócitos ou mulheres com SOP. 

 

Resumo

  • Há fortes evidências para recomendar o uso de um GnRH agonista para desencadear a maturação do oócito antes da aspiração folicular para reduzir o risco de SHO. (Nível A)
  • Há fortes evidências de que as taxas de nascidos vivos são mais baixas em ciclos a fresco autólogos após gatilho com análogos de GnRH, mas não em ciclos doador-receptor. (Nível A)
  • Há evidências moderadas de que as taxas de gravidez em ciclos a frescos autólogos não são comprometidas quando agonista do GnRH é usado em combinação com doses baixas hCG no momento do disparo (gatilho duplo), no momento da retirada dos óvulos, ou durante a fase lútea, em comparação com um gatilho tradicional apenas de hCG. (Nível B)
  • Há evidências fracas de que a suplementação repetida de hCG na fase lutea em ciclos autólogos de transferência a fresco melhora as taxas de gravidez, mas aumenta a taxa de SHO. (Nível C)
  • Não há evidências suficientes para recomendar uma dose mais baixa de administração de hCG sozinho para desencadear a maturação do oócito antes da recuperação do oócito para reduzir o risco de SHO. (Nível C)

 

Recomendações

  • Recomenda-se o uso de um agonista de GnRH para desencadear a maturação como estratégia de primeira linha para reduzir o risco de SHO moderada a grave. (Força da evidência: A; força da recomendação: forte).
  • Recomenda-se adicionar suporte lúteo adequado se estiver usando um agonista de GnRH para desencadear a maturação com planejamento de transferência a fresco. (Força da evidência: A; força da recomendação: forte).
  • Não é recomendado usar uma dose mais baixa apenas para hCG gatilho como estratégia para reduzir o risco de SHO moderada a grave. (Força da evidência: C; força da recomendação: fraco).

 

PAPEL DOS MEDICAMENTOS OU CONGELAMENTO TOTAL PARA PREVENIR SHO

 

Agonista da dopamina

A fisiopatologia da SHO é amplamente atribuída a um aumento da permeabilidade vascular do ovário e capilares peritoneal causados pela hipersecreção ovariana de VEGF. Foi postulado que o tratamento com um agonista do receptor de dopamina, como a cabergolina, pode resultar em uma redução da produção de VEGF e uma subsequente redução na SHO. 

 

Resumo

  • Há fortes evidências de que a administração de agonistas da dopamina perto do momento do disparo do hCG reduz a incidência de SHO moderada a grave. (Nível A)

 

Recomendação

  • Em pacientes com risco de SHO moderada a grave, recomenda-se iniciar um agonista da dopamina, como cabergolina, no dia do trigger com hCG ou logo depois e continuar por vários dias. Estudos relataram uma redução na incidência de SHO quando um agonista da dopamina é administrado isoladamente ou em combinação com outras estratégias de redução de risco. (Força da evidência: A; força da recomendação: forte)

 

Letrozol (inibidor da aromatase)

Níveis séricos elevados de estradiol, tipicamente observados no estabelecimento de uma resposta robusta à estimulação ovariana, estão fortemente associados a um risco aumentado de desenvolver SHO moderada a grave. Estradiol sérico elevado suprime a expressão do receptor KISS1 e aumenta tanto a secreção de VEGF e do óxido nítrico via modulação do receptor de estrogênio. Por causa da relação entre secreção de estradiol e VEGF, foi proposto que a administração de um inibidor da aromatase, como letrozol após a administração da injeção desencadeadora de hCG para diminuir os níveis séricos de estradiol e a incidência de SHO. 

 

Resumo

  • Existe fraca evidência de que o uso de um inibidor da aromatase como o letrozol previne a SHO com base em alguns estudos com resultados contraditórios. Os estudos com um grupo de controle apropriado não relatam redução na incidência de SHO moderada a grave após letrozol administração. (Nível C)

 

Recomendação.

  • Não é recomendado administrar letrozol como intervenção para reduzir as taxas de SHO moderada a grave (Força da Evidência: C; força da recomendação: fraca)

 

Antagonista do hormônio liberador de gonadotrofina após a aspiração folicular

Após o uso do gatilho com hCG, a administração de um GnRH antagonista durante a fase lútea foi proposto como uma intervenção potencial para acelerar a luteólise, reduzir a secreção de VEGF ovariana e promover a regressão dos sintomas associados à SHO. 

 

Resumo

  • Não existem evidências suficientes de que a administração de um antagonista do GnRH após o gatilho com hCG leve a uma redução estatisticamente significante das taxas de SHO moderada a grave. (Nível C)

 

Recomendação

  • Não é recomendado administrar um antagonista do GnRH na fase lútea, sozinho, para reduzir as taxas de SHO moderada a grave. A maioria dos estudos não relata redução nas taxas de SHO moderada a grave ou em sinais e sintomas associados a SHO. Algumas evidências de baixa qualidade sugerem uma  melhora modesta  nos sintomas em mulheres com SHO que receberam um antagonista do GnRH após o gatilho do hCG. (Força da evidência: C; força da recomendação: fraca)

 

Aspirina

O aumento da ativação plaquetária devido aos níveis de VEGF pode levar à liberação de substâncias como histamina, serotonina, fator de crescimento derivado de plaquetas ou ácido lisofosfatídico que pode potencializar ainda mais a cascata fisiológica da SHO. Com base nesta teoria, a aspirina tem sido considerada para a redução do risco de SHO. Existem 3 ensaios randomizados sobre o uso de aspirina para prevenção de SHO. 

 

Resumo

  • Existe fraca evidência de que a aspirina reduz a incidência de OHSS com base num número limitado de estudos mistos. (Nível C)

 

Recomendação

Não é recomendado usar aspirina como estratégia primária para reduzir a incidência de SHO. (Força da evidência: C; força da recomendação: fraca)

 

Metformina

A metformina é um medicamento sensibilizador da insulina comumente usado para tratar diabetes tipo 2 e tem sido amplamente estudado em pacientes com SOP. Foi teorizado que a metformina pode afetar a resposta ovariana, reduzindo o número de folículos não periovulatórios e, assim, reduzindo a secreção de estradiol. 

 

Resumo

  • Existem evidências moderadas de que a metformina reduz a incidência de SHO em pacientes com SOP que apresentam alto risco de SHO no contexto de agonistas de GnRH, mas não de protocolos de estimulação com antagonistas. (Nível B)

Recomendação.

  • Não é recomendado administrar metformina apenas com o objetivo de reduzir a incidência de SHO em protocolos com antagonistas de GnRH porque a maioria dos estudos não relatam um aumento significativo na redução das taxas de SHO em mulheres com SOP que usaram metformina. A metformina pode, no entanto, ser considerada para redução do risco de SHO entre mulheres com SOP utilizando um protocolo com agonista de GnRH. (Força da evidência: B; força de recomendação: moderada)

 

Estratégias adicionais para prevenir SHO (mifepristona, mio inositol, D-quiro-inositol e glicocorticóides)

Tratamentos diversos como a administração de mifepristona, mioinositol, D-quiro-inositol e glicocorticóides foram propostas como potenciais intervenções para reduzir o risco de SHO. Os mecanismos de ação subjacentes a esses potenciais modalidades de tratamento têm vários graus de apoio nas evidências. 

 

Resumo

  • Não existem evidências suficientes para determinar se estratégias como administração de mifepristona, mioinositol, D-quiro-inositol ou glicocorticóides reduzem a incidência de SHO moderada a grave. (Nível C)

 

Recomendação.

  • Não é recomendado administrar medicamentos como mifepristona, mioinositol, D-quiro-inositol ou glicocorticóides para reduzir as taxas de SHO. (Força da evidência: C; força da recomendação: fraca)

 

Congelamento total 

Criopreservação eletiva de todos os embriões e sua posterior transferência em ciclos não estimulados pode ser usada para evitar o aumento endógeno de hCG associado a uma transferência a fresco, que pode exacerbar os sintomas e a duração da SHO (início tardio). 

 

Resumo

  • Existem fortes evidências de que evitar uma transferência de embrião fresco com a criopreservação total de embriões reduz significativamente o risco de SHO moderada a grave em comparação com ciclos de transferência de embriões a frescos. (Nível A)

 

Recomendação

Recomenda-se considerar um ciclo de congelamento total e posterior transferência de embriões congelados em pacientes com risco de SHO com base na alta resposta ovariana ou elevação sérica dos níveis de estradiol. Vários estudos de alta qualidade relataram uma redução significativa nas taxas de SHO moderada ou grave quando esta estratégia é empregada. (Força da evidência: A; força da recomendação: forte)

 

Expansores de volume

A albumina tem baixo peso molecular e meia-vida média de 20 dias. Suas propriedades de ligação e transporte foram hipotetizadas para desempenhar um papel na prevenção da SHO. É importante notar que a albumina é um produto derivado do sangue e pode levar a reações alérgicas, anafilaxia e transmissão de doenças virais ou não identificadas. A albumina aumenta a pressão oncótica plasmática e assim pode contrabalançar o aumento da permeabilidade vascular da angiotensina II. A albumina também pode se ligar a substâncias vasoativas, como fatores relacionados ao sistema renina-angiotensina e VEGF. No entanto, os dados que avaliam a eficácia da albumina na prevenção de SHO são mistos. 

 

Resumo

  • Existe fraca evidência de que o uso de expansores de volume como albumina, HES e manitol podem reduzir as taxas de SHO moderada a grave. (Nível C)

 

Recomendação.

  • Não é recomendado o uso de expansores de volume como albumina, HES ou manitol em pacientes com alto risco de desenvolver SHO moderada ou grave. (Força da Evidência: C; Força da Recomendação: Fraca)

 

CONCLUSÕES

 

A síndrome de hiperestimulação ovariana é uma complicação conhecida da estimulação ovariana controlada. Idealmente, as mulheres em risco desse distúrbio devem ser identificadas antes da estimulação, e protocolos de estimulação que diminuam este risco devem ser selecionados. O uso de protocolos com antagonistas de GnRH, utilizando o agonista do GnRH para desencadear a maturação final do oócito é uma estratégia particularmente eficaz e deve ser considerada como primeira linha para a prevenção de SHO. Outras estratégias que mostram algum benefício incluem o uso de cabergolina e a criopreservação de todos os embriões formados no ciclo.

 

Referências bibliográficas

 

Practice Committee of the American Society for Reproductive Medicine. Electronic address: asrm@asrm.org. Prevention of moderate and severe ovarian hyperstimulation syndrome: a guideline. Fertil Steril. 2024 Feb;121(2):230-245.

 

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