Rossana Cristina Fontes Cotta1
Elaine Cristina Fontes de Oliveira1
Ana Luiza Lunardi Rocha1,2
1Hospital das Clínicas, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil.
2Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil.
Introdução
A hipertensão pulmonar (HP) é caracterizada por uma pressão arterial pulmonar média (PAPm) superior a 20 mmHg em posição supina e em repouso, diagnosticada por meio de estudo hemodinâmico por cateterismo cardíaco direito (CCD). É uma condição fisiopatológica complexa, associada a várias comorbidades, especialmente doenças cardiovasculares e respiratórias.
Apesar de sua relativa raridade, a HP pode afetar mulheres jovens, apresentando desafios significativos durante a gestação devido aos riscos para mãe e feto. A HP está associada a um aumento de 25 a 56% da mortalidade materna, sendo esse risco ainda maior durante o parto e período pós-parto imediato. Além disso, existe o risco potencial de teratogenicidade relacionado ao uso de medicamentos específicos para tratamento da HP, como riociguate, bonsentana, macicentana, ambrisentana, selexipague.
Devido a todos esses riscos associados, o Consenso Internacional de Diretrizes da Sociedade Europeia de Cardiologia (ECS) e da Sociedade Europeia de Pneumologia (ERS), Instituto de Pesquisa Vascular Pulmonar e Fundação do Colégio Americano de Cardiologia/Associação Americana do Coração (ACCF/AHA) contraindicam a gravidez em pacientes com HP.
O suporte em contracepção e planejamento reprodutivo deve ser parte integral do cuidado em pacientes diagnosticadas com HP, especialmente considerando a predominância dessa condição em mulheres em idade fértil, muitas das quais não podem prosseguir com uma gravidez devido aos riscos associados. Uma abordagem individualizada é essencial, avaliando cuidadosamente os riscos e benefícios de cada método contraceptivo em relação ao perfil de saúde de cada paciente, incluindo considerações como tromboembolismo, padrões de sangramento, adesão e efeitos colaterais. Aspectos práticos, como acesso aos métodos contraceptivos, preferências pessoais e objetivos reprodutivos, também devem ser discutidos. É crucial fornecer aconselhamento antes do início de qualquer medicação para tratamento de HP, a fim de evitar exposição a possíveis teratógenos.
Objetivo
Este mini boletim científico, baseado em revisão narrativa publicada na revista Femina em fevereiro de 2024, visa sintetizar as recomendações sobre o uso de métodos contraceptivos em mulheres com HP, analisando evidências de ensaios clínicos e diretrizes internacionais de ginecologia/obstetrícia, cardiologia e pneumologia.
Métodos Contraceptivos e Recomendações
As recomendações sobre contracepção em pacientes com HP são baseadas em revisões de especialistas e diretrizes internacionais, uma vez que não foram identificados ensaios clínicos randomizados ou metanálises específicas para este grupo.
Os métodos contraceptivos que contêm estrogênio aumentam o risco de tromboembolismo venoso e são desaconselhados para mulheres com HP devido aos riscos elevados [categoria 4 dos Critérios de Eligibilidade da Organização Mundial da Saúde (OMS)].
Os métodos apenas com progestagênio são considerados seguros (Categoria 1 dos Critérios de Eligibilidade da OMS) .
Os métodos de barreira, embora seguros, não são recomendados isoladamente devido à maior taxa de falha.
Os métodos de longa duração, como os dispositivos intrauterinos (hormonal ou de cobre) e o implante de etonorgestrel, são preferíveis para mulheres com HAP devido à sua eficácia e poucos efeitos colaterais. Para aquelas com doença cardíaca congênita, métodos mais seguros, como a esterilização e os métodos reversíveis de longa duração, são as opções que deverm ser mais consideradas. Os dispositivos intrauterinos (DIUs) (categoria 2 da OMS) apresentam risco teórico de reflexo vasovagal durante a inserção, sendo recomendado medidas que minimizem o desconforto durante o procedimento. Devido ao risco de síncope durante a inserção desses dispositivos, recomenda-se sua inserção em ambiente monitorado e oferecer analgesia para reduzir o risco de reflexo vagal. O DIU de levonorgestrel (LNG) é uma opção interessante devido à redução do fluxo menstrual e a redução dos episodios de sangramento. No entanto, o DIU de cobre pode aumentar o fluxo menstrual, sendo desaconselhado, especialmente em mulheres com níveis elevados de hematócrito. O implante de etonogestrel é outra alternativa altamente eficaz que também leva à redução dos episodios de sangramento.
É essencial aumentar a conscientização sobre o aconselhamento contraceptivo regular e a prevenção da gravidez em mulheres com HP, incorporando essas práticas como padrão de cuidado. A escolha do método contraceptivo deve ser uma decisão compartilhada entre o profissional de saúde e a paciente.
O quadro 1 resume os principais pontos no aconselhamento contraceptivo de mulheres em idade fértil com HP.
Quadro 2. Pontos-chave no aconselhamento contraceptivo de mulheres em idade fértil com hipertensão pulmonar (HP)
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Conclusão
O aconselhamento contraceptivo é essencial para mulheres com HP, dada a alta morbimortalidade associada à gravidez nesse grupo. Métodos de longa duração são preferidos, com a necessidade de oferecer analgesia adequada durante a inserção de DIUs. Métodos menos eficazes devem ser evitados isoladamente, considerando os riscos significativos de gravidez para essas pacientes.
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